Thursday, February 18, 2010

- Mamã, mamã! O papá chegou! Já posso fazer o teatro?!
- Verónica, mais baixo querida! O papá deve estar cansado...
- Nunca estou cansado para a nossa pequenina!
Deixou cair a pasta no chão e Verónica saltou-lhe para o colo. Desequilibrou-se, mas agarrou-se rapidamente ao corrimão.
- António! Verónica, para o chão imediatamente!
- Mas mamã...
- Nem mas nem meio mas! Lá para cima, já!
A menina cerrou os dentes e arrastou-se até ao quarto.
- António, isto não pode continuar assim! Com a miúda a atirar-se desta maneira para cima de ti não duras muito! Sabes perfeitamente que na tua condição não podes andar para aí a…
- Dança comigo.
- António..!
- Vá lá, chega de conversa fiada. Vamos dançar, vamos ver o teatro da nossa filha, vamos jantar e vamos dormir. E amanhã vamos acordar e vamos comer um pequeno-almoço digno de hotel. E no fim-de-semana vamos até Cascais, ver o mar. E agora, mademoiselle, se me dá a honra desta dança…


E dançaram, e viram o teatrinho da pequena, e foram dormir. E comeram um pequeno-almoço digno de hotel, e no fim-de-semana foram ver o mar a Cascais. E tornou-se num hábito que durou todos os dias até ao último dia de António Antunes, pai, marido, e grande artista do teatro português.

1 comment:

http://fotos.sapo.pt/ZGmiWOuzU6HmOZWnK0JN said...

Pus-me a pensar se as palavras se gastaram, se as letras se esvaíram para um espaço vazio.

Não cheguei a nenhuma conclusão. Sei que o pano todos os dias se abre sob a intensidade de aplausos e se fecha contra a chuva intensa de flores e pétalas, que se vão arrancando.

E no meio? Um texto, uma peça, mas também tantas vidas ou uma só. Vidas com crianças a forçarem o amparo dos braços, a beijarem as faces murchas dos que lhe merecem afecto.

Da simples cadeira onde estou, levanto me e bato palmas a todas as personagens que construíram, que construíste até hoje.

Boas fantasias!